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quarta-feira, 18 de novembro de 2015

PECADOS DO INTELECTO

Após pegar um ônibus da Cidade Cinza, uma sombra que já fora um homem erudito trava o seguinte diálogo com um espírito resplandecente.


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- “Você acha que não existem pecados do intelecto?” disse  espírito

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- “Claro que sim, Dico. Existem os preconceitos, a desonestidade intelectual, a timidez e a estagnação. Mas as opiniões sinceras, seguidas sem medo, isso não é pecado!”

- “Sei que falávamos assim antes. Eu tinha a mesma opinião até perto do fim da minha vida quando me tornei o que você chama de bitolado. Tudo depende do fato do que sejam opiniões sinceras.

- “As minhas certamente eram. Elas não só eram sinceras como heroicas. Eu as confirmava sem medo. Quando a doutrina da ressurreição deixou de fazer sentido às faculdades críticas que me foram concedidas por Deus, eu a rejeitei abertamente. Preguei meu famoso sermão. Desafiei todo o cabido. Aceitei todos os riscos.”

- “Que riscos? O que resultaria disso tudo a não ser o que realmente aconteceu com você: popularidade, seus livros transformados em ‘best- sellers’, convites, e afinal um bispado?”

- “Dico, isso não é digno de você. O que está sugerindo?”

- “Amigo, não faço qualquer sugestão. Veja, EU AGORA SEI. Vamos ser francos. Nossas opiniões não vieram de maneira honesta. Nós simplesmente entramos em contato com uma certa corrente de ideias e mergulhamos nela por ser moderna e estar tendo sucesso. Na faculdade, como sabe, começamos automaticamente a escrever o tipo de trabalho que alcançava boas notas e a dizer a espécie de coisas que arrancavam aplausos. Quando, em toda a nossa vida enfrentamos sinceramente, a sós, a única pergunta para a qual tudo se voltava: se, no final das contas, o sobrenatural não poderia de fato ocorrer? Quando resistimos sequer por um momento à perda de nossa fé?! ✞ † [...] Isso é claro. Deixando-nos arrastar, sem resistência, sem orar, aceitando toda solicitação quase inconsciente de nossos desejos [...] As crenças são sinceras no sentido de ocorrerem como acontecimentos psicológicos na mente do homem. Se é isso que você julga ser sinceridade, elas são sinceras, e também as nossas o foram. Mas os erros sinceros nesse sentido não são inocentes. Venha comigo.” 

- “Bem, essa é uma ideia. Estou perfeitamente disposto a considerá-la. Naturalmente precisarei de algumas garantias... Quero ter a certeza de que me levará a um lugar ande encontrarei uma esfera mais ampla de utilidade — e campo para os talentos que Deus me concedeu — assim como uma atmosfera de livre pesquisa — em resumo, tudo o que consideramos civilização.”

- “Não”, respondeu o outro. “Não posso prometer nada disso. Não haverá esfera de utilidade: você não é absolutamente necessário ali. Nenhum campo para os seus talentos: somente perdão por tê- los pervertido. Nenhum ambiente favorável à livre pesquisa, pois vou levá-lo ao país das respostas e não das perguntas, e você verá a face de Deus.”  [...] 

- “Veja bem. Não percebo em mim qualquer sede por uma verdade já pronta que põe um fim à atividade intelectual da forma que você está descrevendo. Será que terei liberdade de mente, Dico? Devo insistir nisso, você sabe.”

- “Você já foi criança. Você já soube o propósito da pesquisa e do questionamento. Houve tempo em que você fazia perguntas porque queria respostas, e ficava alegre quando de súbito as encontrava. 
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Volte a ser de novo essa criança, mesmo agora...”

(O GRANDE ABISMO; C. S. Lewis)

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